domingo, 14 de setembro de 2014

Juca, Fruteiro


O Juca era um cara simples, desses que a gente chama de simples para não chamar de chucro. Juca era chucro, e essa era a verdade. Ele tinha uma quitanda humilde, em um bairro nobre, que recebia todo o tipo de gente. Era um cara simpático, apesar de discreto. E eu gostava disso nele.

Num dia desses, um dia qualquer, um casal à beira da terceira idade, discutia as injustiças do mundo quanto a noção de maturidade entre os gêneros. Estavam bem à minha frente, entre Juca e eu, escolhendo suas frutas e legumes e, divagando suas aflições a quem quizesse ouvir.

Era inevitável ouvir, ela dizia: “Acho ultrajante que envelheçamos, enquanto vocês, amadurecem! O mundo trata de nos empurrar à cova e ascendê-lo à sabedoria!~ - Creio que quem a ouviu, compactuou do desabafo. O patriarqusimo do mundo é triste e incontestável.

Mas o homem, prontamente, replicou empunhando uma tenra manga: ~A meu ver, tratamos os gêneros de forma diferente. Enquanto vocês são frutas, que logo atingem sua deslumbrante e suculenta maturidade, somos como garrafas de vinho, desprezadas até que se envelheça ~.

Nos entreolhamos envolvidos pelo diálogo. Juca, ao contrário, fazia seu trabalho de indicar e pesar os itens aos clientes. “Mas eu quero ser vinho, mereço ser vinho, não acha?” – “Acho! Acho sim, mas o mundo é o mais cruel dos articuladores. Talvez nossa netinha dê sorte...”.

Ela concordou decepcionada e, todos nós, nos decepcionamos um pouco. Juca não, manteve-se sereno. Na minha vez, apontei um cacho de uvas e ele, com sua indefectível discrição, provocou-me: “Sabe, o sujeito estava certo, homens são como garrafas de vinho e mulheres como frutas!”.

Espantei-me com a afirmação e não dissimulei. Ele logo emendou: “Mas quando um cara não envelhece ao lado da sua mulher, a mulher de uma vida, acaba garrafa e só. Oco e de vidro. É que o vinho, meu amigo, é fruto da fruta!” - Juca era um cara chucro, que sabia das coisas.

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