É mais ou menos no momento em
que ouvimos o clique do metal no ferrolho do cinto que pensamos: “Taí um bom
dia para morrer!” – E não digo só pela minha estranha obsessão ao último
capítulo da história (minha e sua), mas é que admitir a morte de bom grado aí, vai
bem!
E precisamente por isso sou
capaz de entender a fobia dos fobistas às aeronaves. Como não temer, feito gato
escaldado, a clausura de um objeto capaz de carregar mais de duzentas pessoas, como
se porcos na boleia, a uma altura que beira aquela tal celestialidade do fim?
Por isso imagino que, se já tão
perto de Deus, o único meio de topar a aventura da decolagem, é aceitando que,
pela impotência a qualquer solução MacGyveriana (caso algum erro), morrer é possibilidade
real. Especialmente porque qualquer erro na aeronáutica tende à fatalidade.
Não que seja fácil errar,
conheço os aeronautas e seus rigores, e sei que despencar das alturas depende
quase que exclusivamente de dois fatores: Desleixo do piloto ou capricho de
Deus. O resto, a ciência aeronáutica tratou de garantir ao longo dos anos,
aprimorando papai Dumont.
Mas ainda assim (ou justamente
por isso) minha tolerância aos cagões dos ares. Os entendo, meus caros! Mesmo
que eu não tenha medo nenhum, os entendo. O alçar voo, o aterrissar, as
turbulências, o banheiro de lata de sardinhas e até os terroristas! Me encanta a
missa inteira!
Assim como me encanta viver,
claro que sim! Mas gosto de voar, porque voando vou a lugares distantes. O
bastante para me desconectar da rotina, mas também, em seguida, me colocar em
abstinência para a volta. Gosto de estar em trânsito. Gosto de ir, tanto quanto
voltar.
Gosto de pensar que morrerei
dormindo, quando isso vier a acontecer. De preferência de velho e sem estar
doente. Pretendo apenas esquecer de respirar na alta madrugada e nunca mais
acordar. Mas se, na paz do voo alguma pane aérea, será sim, um bom dia para
morrer.