Voltava no dia seguinte, no
mesmo horário, e cumpria seu ritual. A verdade é que eu estava acordado e,
com os olhos semicerrados, acompanhava a angústia daquela pequena ave tentando
chamar a atenção. Já fazia duas semanas e eu tinha certeza que queria me dizer
algo.
Por algum motivo que
desconheço, resisti. Resisti o quanto pude às investidas do passarinho, mas
gostava da sua visita diária. A música emitida por seu minúsculo bico não se
repetia e era sempre encantadora, já a vontade de ser notado, estava em seus
olhos, essa não mudava!
Levou mais uns dias e eu
finalmente decidi que ele podia se manifestar. Esperei-o acordado naquela
noite. Arrastei a poltrona para a frente da janela e levei uma meia garrafa
de merlot comigo. Sentei e golejei direto do gargalo, sem pressa, até que fosse
a hora dele aparecer.
Precisamente às três da
madrugada, pousou, pela última vez, diante do parapeito da janela, encontrando-a
escancarada. Ergui a garrafa em brinde e convidei-o para dentro. Surpreso por
não ter o vidro bloqueando o caminho, aproximou-se em pequenos e
excitados saltos.
Era pacificador ver o alívio
em seus pequenos olhinhos de caroço de mamão. Ele então voou até meu ombro e me
encarou profundamente. Em seguida disse: “Não tenho mais nada para lhe oferecer,
e você?” – Eu não tinha nada a oferecer. Ele então voou janela a
fora, para sempre.
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