domingo, 29 de setembro de 2013

O Rouxinol da Minha Janela


 Pousava ao pé da minha janela, todo dia (apesar de sempre à noite), um ávido e intrépido rouxinol. Bicava o vidro incansavelmente, tentando me fazer despertar. Depois cantarolava algumas belíssimas notas que me tocavam a alma, penetrando a grossa vidraça. Aí ele partia.

Voltava no dia seguinte, no mesmo horário, e cumpria seu ritual. A verdade é que eu estava acordado e, com os olhos semicerrados, acompanhava a angústia daquela pequena ave tentando chamar a atenção. Já fazia duas semanas e eu tinha certeza que queria me dizer algo.

Por algum motivo que desconheço, resisti. Resisti o quanto pude às investidas do passarinho, mas gostava da sua visita diária. A música emitida por seu minúsculo bico não se repetia e era sempre encantadora, já a vontade de ser notado, estava em seus olhos, essa não mudava!

Levou mais uns dias e eu finalmente decidi que ele podia se manifestar. Esperei-o acordado naquela noite. Arrastei a poltrona para a frente da janela e levei uma meia garrafa de merlot comigo. Sentei e golejei direto do gargalo, sem pressa, até que fosse a hora dele aparecer.

Precisamente às três da madrugada, pousou, pela última vez, diante do parapeito da janela, encontrando-a escancarada. Ergui a garrafa em brinde e convidei-o para dentro. Surpreso por não ter o vidro bloqueando o caminho, aproximou-se em pequenos e excitados saltos.

Era pacificador ver o alívio em seus pequenos olhinhos de caroço de mamão. Ele então voou até meu ombro e me encarou profundamente. Em seguida disse: “Não tenho mais nada para lhe oferecer, e você?” – Eu não tinha nada a oferecer. Ele então voou janela a fora, para sempre.

Nenhum comentário: