quinta-feira, 25 de abril de 2013

Na Velocidade das Lesmas



Miro na política dos caramujos. Aliás, me orgulho muito dos caramujos que sabem mesmo ir além da condição caramújica deles. E se digo, é com conhecimento de causa, que os conheço bem! Ontem a noite, juro a vocês, brindei três ou quatro garrafas numa roda molúscula!

E foi lá pelo terceiro copo que um deles disse: “Rapaz, me trás uma cerveja bem gelada que, se eu saio para buscar talvez não volte ou, se voltar, perdeu o gelo!” – No caminho à geladeira, gargalhei tanto quanto chorei da clareza limitante que têm meus simpáticos amigos viscosos.

Os caramujos não têm tempo a perder nesse mundo e rastejam seu pouco tempo em velocidade milimétrica. Quase me falta ar, só de pensar no tempo que levam para ir daqui a ali. A noção que eu tinha, antes da noite de ontem, é que os caramujos morriam, de tédio!

Aí o mais sábio deles, já ebriizado como todos nós, me contou sem nenhuma pressa que, pressa, é coisa para otário! “Pense em nós dois, humano!” – Veio ele com a lição – “Minha lentidão e poucos anos, são exatamente como suas pernas apressadas e seus tantos anos”.

O maldito comparou toda minha trajetória, entre pernas, rodas e asas, e me provou por A mais B que não há muita vantagem nessa condição bípede/sapiens/apressadus. Tudo o que eu vejo ao longo dos anos é tudo o que ele vê. E apenas duas coisas determinam nossas espécies:

A primeira é a cerveja gelada que, segundo ele, é o grande trunfo do ser humano, pois, os moluscos (pobres moluscos) nunca conseguem uma cerveja gelada por conta própria. A outra é a paciência que, o ser humano (pobres humanos) nunca obtém por conta própria. E foi além:

“Quando te digo paciência, humano, me refiro à paz da ciência. Conhecer o que te cabe conhecer, sem esperar que seja uma necessidade urgente. Tome seu tempo para descobrir as coisas. Beba uma cerveja no caminho. É saborosa, não é? Deguste essa cerveja. E a vida!”.

Nessa hora fui buscar mais uma garrafa e gritei de longe: “Opa, essa tá trincando!” – E todos eles vibraram, sabendo que, mesmo de longe, eu traria o néctar ainda em condição polar para a roda. Aí o sábio fez questão de ratificar a filosofia ébria, sacramentando-a à conversa:

“O que te faz feliz, humano: A rotina das coisas boas, ou a coisa boa que surpreende?” – Pensei primeiro na coisa boa que se repete sucessivamente, mas, a repetição cansa qualquer coisa boa, tornando-a óbvia, como a cerveja gelada. Optei pela surpresa, convicto da escolha.

“Pois essa é a única felicidade possível!” – Garantiu meu guru lêsmico – “Gastei mais de meia vida para sentar nessa mesa com você, quando eu for embora, é para morrer pelo caminho. Não posso contar com a felicidade das coisas que se repetem porque não há garantias”.

“E se não há garantias, prefiro a expectativa despretensiosa das surpresas. Eu jamais conseguiria atravessar o mundo ou outras culturas, quiçá um jardim florido! Então minha felicidade está na infimidade oculta em cada centímetro adiante, sempre adiante.” – Disse ele.

Nesse momento, contemplamos todos, o desejo pela plenitude da felicidade. Nos abraçamos e nos homenageamos com a sinceridade exacerbada do álcool. Eu, ainda catártico, fiquei à mesa um tempo, enquanto eles se despediam de mim e entre eles. Efusivos e apaixonados.

Alguns bons minutos depois, voltei a mim e paguei a conta. Levantei zonzo e fui em direção a saída, mas, antes de chegar, passei por eles e cada um jazia pelo caminho, uns aqui outros ali. Vocês talvez não queiram acreditar, mas, sorriam. Estavam felizes e, talvez até mais que eu...

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