segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Dezencontros Casuais


Desliza sobre o balcão um copo americano até a boca de café preto. Marcos o agarra, assopra e saboreia o primeiro gole, depois rebate o açucareiro metálico e aponta para o café, prefere natural. Pensa na vida. Os olhos vagos no copo. Pede ao garçom que lhe faça um pão na chapa.

Marcos pensa no grande amor que nunca viveu e no tempo que passa. Obsessivamente desatento não percebe a linda mulher que se aproxima, tomando o acento ao lado no balcão. Margarete pede um suco de laranja e em seguida o açucareiro a Marcos. Adoça o suco e sai.

Passam uns dias e, no mesmo miolo do centro da cidade, Marcos lê furtivamente as notícias de capa na banca de jornais, dá o último trago e amassa a bituca nos pés, cruzando Margarete que se aproxima do atendente por um maço de cigarros. Distanciam-se às costas um do outro.

Fim do dia e, ponto de metrô, ambos esperam na estação. No mesmo trem, se esbarram compulsiva e involuntariamente até a primeira baldeação. Ela desce. Marcos a acompanha com os mesmos olhos obsessivamente desatentos de sempre. Apenas a mulher da sua vida.

Mais um tempo depois, um almoço trivial no restaurante preferido. Marcos encontra sua habitual mesa ocupada por duas executivas tagarelas. Margarete, claro, e outra. Pensa em partir, mas, acaba na mesa ao lado. Precisa comer. As mulheres discutem alguma promoção.

Impaciente, se dá uma noite etílica no bar próximo ao trabalho. Senta-se no balcão com uma boa dose de Bourbon. Frustrado e só, deixa-se contagiar pela alegria da jovem que parece celebrar algo ali. Margarete, mais uma vez, e o pessoal do escritório. É seu brinde a Balzac.

Depois da ressaca mútua e, ocasionalmente, de toda a primavera, se alinham, bem longe dali, em um shopping center, na fila do cinema. Depois na fila da pipoca e dispersam-se, silenciosamente, na porta da sala. O mesmo filme, fileiras diferentes. O acaso faz sua graça.

Com o verão ardendo a pino, belo domingo, a parcela menos entusiasta dos raios solares refresca-se na sorveteria em frente ao parque municipal. A combinação de sabores, menta e iogurte, une indiretamente o casal de desconhecidos mais próximo do planeta. Não se veem.

Durante um dia corrido na agência, sem tempo para um almoço cuidadoso, Marcos devora um sanduíche no banco da praça. Há algum tempo perdeu o interesse pela boa forma. Margarete, no banco ao lado, tem os olhos vagos. Ela e ele, ambos, incapazes de olhar além da frustração.

“Alô, é da agência de empregos?” – “Não senhora, somos uma agência de viagens!” – “Ah, desculpe, devo ter me confundido”. As vozes se despedem, convencidas do desproposital engano. Finalmente se descobrem no mundo, da mesma forma displicente dos últimos meses.

Pela última vez se encontram, frente a frente na mesa da agência: “Preciso de uma passagem urgente para a capital, tenho uma entrevista”. Trocam cordialidades pequenas. O diálogo raso entre vendedor e cliente. Deseja-a boa sorte na entrevista, ela agradece. Apertam as mãos.

Marcos suspira pela frustração da vida solitária. Derrotado para o amor e, simplesmente, cego. Margarete consegue a vaga na capital. Vive para o trabalho, por mais ninguém. Debruça-se na janela do escritório e pensa na falta de oportunidade para uma vida a dois. Toca o telefone...

Um comentário:

Just me disse...

Acho k é por isso que se diz que devemos olhar sempre à nossa frente, pois ali pode estar aquilo que precisamos ou esperamos!!!!