sábado, 14 de dezembro de 2013

Beneficente


Depositou o copo meio cheio (de água) sobre a mesa. Delicadamente, para que não esbarrasse em nenhum outro artefato da elegante mesa. Prezava pela discrição e, com todo cuidado do mundo, perguntou: - Arnaldo, será que isso vai dar certo? – Arnaldo se mostrou confuso.

- Nós dois, você diz? – Lorena acenou positivamente. Ambos tomaram mais um gole de suas águas (em absoluto silêncio) e logo o garçom apresentou o vinho. Arnaldo autorizou que fosse servido. Brindaram, como se brindassem pelos ali presentes, e tragaram a taça de uma só vez.

- Acho que não, Lorena! – Ela engasgou suavemente, como se, quase surpresa. Se entreolharam, buscando algo que os fizesse dissuadir do fracasso iminente daquele jantar. – E o que você sugere? – Francamente? – Sim – A lagosta! – Me refiro a nós dois! – Ah sim. Mais vinho!

Lorena tratou de acionar o garçom e Arnaldo, batendo displicentemente com o indicador na garrafa vazia, solicitou outra. E lagostas. No fim do jantar (e da quarta garrafa de vinho), Lorena parecia menos reticente e ousava exibir seu sorriso aos demais, naquele jantar beneficente.

- Me sinto o centro das atenções, todos nos olham! – Creio que seja um bom sinal, beba seu vinho! – Lorena virou, num só gole, a décima (ou décima primeira) taça e gargalhou ruidosamente, chamando toda a atenção no enfadonho evento. Depois brindou, de taça vazia.

Uns pareciam constrangidos com a senhora de sessenta anos, à mesa com um garoto de vinte e poucos. Outros pareciam discretamente contrariados. Lorena, recém traída (e divorciada), só parecia feliz, e realizada, com seu garotão. Como se representasse toda uma categoria.

Não representava e, antes de ficar aborrecida com os julgamentos vizinhos, tratou de contribuir com a causa (com a admirável e habitual generosidade) e levar sua sobremesa para um motel, perto dali.

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