terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Os Monstros Embaixo da Cama




Tenho medo do escuro e não é de hoje. Um pavor sobre-humano do breu silencioso da madrugada. Desde menino. E embora essa sensação de fragilidade tenha se atenuado pelos anos, conservo a desconfiança (quase igual) às coisas que não estão ao alcance dos olhos.

Como os monstros que moram sob minha cama. Parasitas de mim, pois, mesmo noutra cama, em outra casa, continuam lá, confabulando o bote fatal! Aonde quer que eu esteja. Sempre! Não me perseguem a luz do dia, pois têm o capricho de preferir o terror à penumbra.

Remoo minha sanidade noite após noite (e descobri na adolescência que a sobriedade é contra aliada!), esperando o inadiável fim da vida, borbulhando pela jugular dilacerada. Mas eles gostam mesmo é do terror. Se alimentam do medo. Meu sono leve e ressabiado. Já descobri!

Por isso firmei um pacto mudo, por conta, crente da aceitação mônstrica. Velo meu próprio corpo, toda noite. Sozinho ou acompanhado, reservo-me ao congelamento do esqueleto (de algum momento em diante) e não mexo um fio de cabelo mais, até o sol do dia seguinte.

A gincana da vida! Troco a dor nas costas, a saliva acumulada na boca e a coceira na ponta do nariz, pelo dia seguinte. Não movo um fio sequer. Apenas pelo dia seguinte. Pela simples vida viva do próximo dia. E pela mais simples crença no latim. O tal do carpe diem.

A única segurança que nos dão. Que é ter o agora nas mãos e fazer algo com isso. Jogar com a última oportunidade de jogar, já que, se não agora, nunca mais! Aprendi que a cada metro adiante tem uma bifurcação: linha reta ou o espesso muro do ‘nunca mais’.

Aí é que tocamos o passo em linha reta ou damos com os dentes no muro. Cegos, estúpidos e banguelas. Nenhuma esperança à frente, pois, nada mais à frente. Apenas a certeza do fim da linha e os urubus rodeando a carniça, impacientes. Esganiçando sua fome reverberante.

Os monstros embaixo da cama. É o que são! E meu desejo diário de estar vivo, vem do esforço de vencê-los em cada noite nova. Trata-se dessa nossa necessidade dogmática do autoflagelo. Quem não? Sofro, mas vivo a intensidade da vida que me cabe porque, fechar os olhos dói.

Dói no corpo, de tanto que dói na alma. As frustrações, os atrasos, os débitos todos. Os monstros! São eles doendo em mim. Se alimentando disso e é por isso que não me movo a noite. Conto até mil e durmo. Vitória! As mil ovelhas para a carne intacta. E a massa encefálica.

Então, quando as luzes do dia me acertam na retina, ajeito a coluna, seco o travesseiro babado e vou à vida! Livre das mazelas que esmagam a espuma do meu colchão. Leve, como se livre. Agonia e preocupação, agora, só na fatídica hora da cama. E um dia inteiro à frente.

Respiro fundo, inspiro um pouco e transpiro muito. Postergando ao máximo meu leito, tentando vencer os monstros pelo cansaço (as vezes funciona). No rangido ósseo das costelas que me separam do submundo da cama. Toda noite, boa noite não é oferta, mas, afirmação!

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