Tenho medo do escuro e não é
de hoje. Um pavor sobre-humano do breu silencioso da madrugada. Desde menino. E
embora essa sensação de fragilidade tenha se atenuado pelos anos, conservo a desconfiança
(quase igual) às coisas que não estão ao alcance dos olhos.
Como os monstros que moram sob
minha cama. Parasitas de mim, pois, mesmo noutra cama, em outra casa, continuam
lá, confabulando o bote fatal! Aonde quer que eu esteja. Sempre! Não me
perseguem a luz do dia, pois têm o capricho de preferir o terror à penumbra.
Remoo minha sanidade noite
após noite (e descobri na adolescência que a sobriedade é contra aliada!),
esperando o inadiável fim da vida, borbulhando pela jugular dilacerada. Mas
eles gostam mesmo é do terror. Se alimentam do medo. Meu sono leve e ressabiado.
Já descobri!
Por isso firmei um pacto mudo,
por conta, crente da aceitação mônstrica. Velo meu próprio corpo, toda noite.
Sozinho ou acompanhado, reservo-me ao congelamento do esqueleto (de algum
momento em diante) e não mexo um fio de cabelo mais, até o sol do dia seguinte.
A gincana da vida! Troco a dor
nas costas, a saliva acumulada na boca e a coceira na ponta do nariz, pelo dia
seguinte. Não movo um fio sequer. Apenas pelo dia seguinte. Pela simples vida
viva do próximo dia. E pela mais simples crença no latim. O tal do carpe diem.
A única segurança que nos dão.
Que é ter o agora nas mãos e fazer algo com isso. Jogar com a última
oportunidade de jogar, já que, se não agora, nunca mais! Aprendi que a cada
metro adiante tem uma bifurcação: linha reta ou o espesso muro do ‘nunca mais’.
Aí é que tocamos o passo em
linha reta ou damos com os dentes no muro. Cegos, estúpidos e banguelas.
Nenhuma esperança à frente, pois, nada mais à frente. Apenas a certeza do fim
da linha e os urubus rodeando a carniça, impacientes. Esganiçando sua fome
reverberante.
Os monstros embaixo da cama. É
o que são! E meu desejo diário de estar vivo, vem do esforço de vencê-los em
cada noite nova. Trata-se dessa nossa necessidade dogmática do autoflagelo.
Quem não? Sofro, mas vivo a intensidade da vida que me cabe porque, fechar os
olhos dói.
Dói no corpo, de tanto que dói
na alma. As frustrações, os atrasos, os débitos todos. Os monstros! São eles
doendo em mim. Se alimentando disso e é por isso que não me movo a noite. Conto até mil e durmo.
Vitória! As mil ovelhas para a carne intacta. E a massa encefálica.
Então, quando as luzes do dia
me acertam na retina, ajeito a coluna, seco o travesseiro babado e vou à vida!
Livre das mazelas que esmagam a espuma do meu colchão. Leve, como se livre.
Agonia e preocupação, agora, só na fatídica hora da cama. E um dia inteiro à
frente.
Respiro fundo, inspiro um
pouco e transpiro muito. Postergando ao máximo meu leito, tentando vencer os
monstros pelo cansaço (as vezes funciona). No rangido ósseo das costelas que me
separam do submundo da cama. Toda noite, boa noite não é oferta, mas,
afirmação!
Nenhum comentário:
Postar um comentário