sexta-feira, 29 de julho de 2011

Descontrolado



Começa pelas mãos. Antes de me dominar o corpo todo, é nas mãos que surge, poderosa e irrefutável. É no toque suave, da ponta dos dedos, que sinto a troca sincera e pura entre a temperatura do recipiente e as listras tênues da minha impressão digital. Sinto o arrepio.

Percorre o braço e atinge a nuca. Cada pelo. Proporcionando um prazer delicadamente orgásmico e, então, alcança meus olhos. Não! São eles que te alcançam. Sinuosa, excitante, vigorosa e provocante. As papilas umedecem. Os músculos enrijecem. Tenho você nas mãos.

E nessa torpe noção de controle, no domínio falso que exerço sobre você, te levo à boca, num beijo caloroso e envolvente. Somos praticamente um só corpo. Fundidos. Arremesso seu conteúdo depravado para dentro de mim. Todo meu bom senso se deprava. Sou o que você é.

Libidinoso, impuro, livre. O anti-puritano! Baixo a guarda do moralismo. Tiro a roupa. Aquela que a sociedade veste, não o pano metade por cento algodão que me aquece. Tiro a roupa moral dos costumes fajutos que os pais dos pais, dos pais dos meus pais embutiram em mim.

Eu danço. Enquanto você desliza, esôfago abaixo, danço como se gostasse disso. Corre no meu sistema digestivo e doma meu fígado. Se espalha por minha corrente sanguínea. Perco o controle. Sorrio. Quem disse que intenciono o controle? Assuma você! Já abri mão de mim.

Metade do meu corpo sou eu. A outra metade é, exclusivamente, você. Equilíbrio volátil. Quero mais de você que de mim. Desiquilibrado. E cada vez mais, menos de mim. E mais de você. Para o meu fôlego. O meu fígado. A minha incansável disposição. Adorável tendência.

Os músculos então relaxam. Os olhos, a mente, a vida. Apenas relaxo. Porque agora sou, definitivamente, você. Abro passagem para o resgate daquele eu que a moral jamais deixaria vir à tona. Meu eu essencial. Porém, insisto em dizer, meu verdadeiro eu, é mais você que eu.

Aliás, por isso você em mim. Coordenando, libertando. Assumindo o controle. Fique à vontade, sinta-se em casa! É bom alguma liderança, pra variar. Não me gerencio das oito às seis. Delego, displicente, à rotina. Não me gerencio após, mas respeito cego, sua infalível administração.

Não por muito tempo. Você dilui. Evapora. Dissimula essa famigerada liberdade que, num piscar de olhos, se converte em dor de cabeça e remorso. Quase abro mão, mais uma vez, a cada dia seguinte. Mas a satisfação, da insatisfação turva, alimenta meu fascínio físico.

Não por menos, quando a dor da cabeça se dissipa, o dia se esvai e os inconvenientes pesam, você toma novamente seu lugar. Minhas mãos anseiam, os pelos encrespam, o boca saliva e os músculos enrijecem. Me acalmo, finalmente, com você bem dentro de mim. Perco o controle.

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