domingo, 8 de maio de 2011

Alimentando a Fé



Filmes de terror não estão entre meus preferidos. O medo nunca foi uma necessidade fílmica para mim. Mas se pudesse escolher algo capaz de me assustar e despertar minha curiosidade, iria no terror católico, de demônios e descrença nas divindades. Isso sim.

Em “O Ritual”, Anthony Hopkins é um padre exorcista (desses que fazem o tipo gênio indomável, ignorando protocolos) que tem a tarefa de reascender a fé em um jovem seminarista em crise. E essa reconstrução da fé é minuciosa até para nós, expectadores.

As evidências apresentadas ao jovem Michael Kovak (Colin O'Donoghue, o seminarista) pelo padre Lucas (Hopkins) não o convencem tal qual não nos convencem. Parecem truques infantis e somos forçados a compactuar da descrença do pré-paroco.

Até que a frase mais forte do filme é lançada pelo próprio Dom Lucas: “Escolher não acreditar no diabo, não o protegerá dele” – Eis o meu dilema pessoal! A falta de fé no céu e no inferno não me exime do medo juvenil do desconhecido. E agora, meu Deus?

A única garantia que tenho da defesa aos ataques demoníacos, nas solitárias noites escuras do meu quarto, é a certeza de que nada disso existe. Aí vem um maldito padre Lucas e diz que isso não é suficiente para a proteção da minha inexistente alma? Ferrou!

Mas, no meio disso, interessante ponto de vista de Mikael Håfström (diretor sueco habituado às obras de terror) ao transformar um simples filme de exorcismo num thriller de angústia e dilemas. Não há fortes cenas de susto, nenhuma surpresa em volume alto.

Seria muito óbvio fazer dos takes nas sessões de exorcismo um ataque aos nossos ouvidos e coração, mas as cenas são apresentadas com rigorosa cautela, há um certo “prepare-se, é agora”. Isso faz de um medroso como eu, o expectador mais interessado.

Até que percebemos (presos à cadeira, músculos enrijecidos), não se tratar exatamente de um filme de terror, mas, de um desafio à fé nos dias atuais. A perda da força cristã na era da informação e auto-suficiência. Estamos no meio de uma transição histórica.

Como em “Merlim” que abordava a transição do mágico para o cristão na idade média. A chegada de Cristo enquanto a derrocada dos seres místicos (fadas, elfos e gnomos). “O Ritual” aborda com precisão essa crise que chegou ao clero vaticanês.

E Hopkins dispensa elogios, sempre. Mesma cara perturbada, personalidades distintas. Alicinha Braga com sua habitual beleza sulcada, segue com esmero os discretos passos hollywoodianos da tia. A atuação em “O Ritual” não é brilhante, mas pontual.

Porque o filme, no conjunto, não é brilhante. Inovador sim, uma nova cara para o terror, muito mais convidativo e emblemático, mas, como toda reinvenção de gênero, oferece alguns clichês e apenas abre precedentes para os próximos diretores o seguirem.

Já o interesse pelo resgate da fé é claro, mas, pelo meu orgulho cético, convenceu-me só por duas horas. Méritos pelo feito artístico/cristão! Por outro lado, viva a sétima arte porque, não fosse o asco a um tal Hannibal Lecter, Hopkins teria me jesuítado à igreja!

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