quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Pipoca e Pães de Queijo na Capital do Não Carnaval – Dois filmes em uma crítica


Foi um carnaval cultural esse. Como eu procurei encontrar e como o encontrei à minha procura. Metropolitano. Sem vestígios da folia tradicional e das bundas purpurinadas da TV. Estive em Belo Horizonte e adicionei uma nova capital ao meu currículo geográfico. Prós e contras. Não vim falar dela. Assisti a três filmes no cinema: “Percy Jackson e o Ladrão de Raios”, de Chris Columbus (não vim falar dele), “À Procura de Eric”, de Ken Loach e “Ninho Vazio”, de Daniel Burman (Vim falar deles!). Para o último, confesso (estou sempre confessando, não?), será uma crítica clandestina, pois, já havia visto. Mas, como não no cinema, vetei-me ao direito de citá-lo antes.

Comecemos pelo “Eric”. Que filme humano! Tantos sentimentos puramente nosso, expostos e destrinchados quadro a quadro. O filme diz respeito ao próprio Eric, um carteiro inglês em processo depressivo-destrutivo que cria os filhos que não são dele e se enche de culpa pelo fracasso do seu primeiro casamento (os enteados em questão são do segundo). Desistente das alegrias e satisfações da vida, ele entrega a seu messias (pai, filho e espírito santo) a última oportunidade de não tirar o suicídio para dançar. Entretanto o peculiar messias é seu homônimo Eric Cantona, o controverso ex-atacante do Manchester United. Admito que, mesmo sendo um boleiro entendido, desconhecia a existência de São Eric.

O filme evoca a comédia. No trailer, no cartaz e na sinopse. Eric (o Cantona) surge no filme, dentro do quarto de Eric (o carteiro) depois de uma sessão particular de maconha (surrupiada indiscretamente do mais problemático dos enteados). Mas não se engane, as quase duas horas que se seguem vão muito além do escracho absurdo que propõe. Transpira o mais astuto e homogêneo sentimento inglês de valorização a amizade, às fraquezas humanas e a impotência diante de problemas maiores. Não dispensa a comédia, muito pelo contrário, é indispensável rir. Mas um riso franco e complacente. Sem desdém pelos apuros que passa nosso anti-herói. As situações vão se direcionando a um surreal limítrofe e, dentro do contexto (singelamente) absurdista, apresenta um desfecho satisfatório e revigorante. Mas “À Procura de Eric” não chegou por acaso nos meus sentidos. Invadiu a Setlist de 2009 no meio do ano, na ocasião da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, mas, adversidades da época o fizeram passar batido.

“Passou Batido”, aliás, é o nome da mostra que atirou “Eric” no meu colo, junto de “Ninho Vazio”. Trata-se de um invento de qualquer alma santa mineira que ocupou a sala do Palácio das Artes (vale a pena!) apresentando, no mês todo de fevereiro, cinco obras importantes do ano anterior. Foi uma maratona, um seguido do outro. Mas apenas estes dois!

O “Ninho Vazio” eu havia assistido há muito pouco, por muito acaso, numa situação muito clandestina de um download muito providencial em um desses sites de muitos filmes em torrent. Na época, me interessei pelo trailer e o download estava lá, me convidando como aqueles bolos de desenho animado convidam os dietistas (Me coma! Me coma!). Não sabia nada a respeito do filme e menos ainda, que algum tempo depois poderia vê-lo em telas dignas.

A propósito, peço licença para esclarecer minhas atividades ilícitas: Tenho uma política peculiar à pirataria pessoal (e jamais transcendo a pessoal), não baixo filmes que tenho a possibilidade de ver no cinema. O cinema está em primeiro plano. Sempre! É claro que essa política é furada dada a minha compulsão. Já baixei (sem querer, juro!) pelo menos três filmes que entraram em cartaz. Enfim.

O “Ninho”, particularmente, era um desses que eu gostaria muito de ter tido a honra. E a mostra “Passou Batido” me ofereceu ele a R$5,00. Um presente incalculável! É uma história daquelas que tocam a parte mais funda do coração, aquelas difíceis de tocar. Um “Peixe Grande” latino-americano. Quer dizer, sem comparações, não tratam nem o mesmo tema (diretamente), mas a sugestão do Tim Burton foi uma das recentes obras a me tocar como o “Ninho” tocou.

Leonardo, o protagonista, é um romancista reconhecido moderadamente. Martha, sua esposa, uma mãe que abriu mão da vida. Tudo pela família, carreira do marido e filhos. Têm juntos três filhos e, a trama começa quando Julia, a única filha mulher, além de adolescente e mais velha entre os três, passa a primeira noite fora de casa. Daí para frente, a beleza pela sutileza que nos é delicadamente despejada pelos personagens, poucas escolas como a da Argentina oferecem. Uma obra prima que eu não sinto sequer confiança em descrever com mais detalhes por acabar, involuntariamente, relatando mais que devo. Vale à pena. Simplesmente vale à pena.

Dois mil e dez me deu um carnaval memorável, para repor energias e reacender inspirações. Belo Horizonte me acolheu distanciando-me providencialmente da famigerada festa de inauguração ao ano comercial (hipocrisia). E se meu papel é sugerir, não hesito em negar apenas “Percy Jackson” nessa maratona. Não por ser necessariamente ruim, mas dispensável, juvenil. Talvez pela cópia ser dublada (não me atrai). Não sei, os outros dois o sobrepuseram, talvez seja só isso.

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